Publicado em: 24/03/2025
Crise de atenção? Algoritmos, não apenas celulares, podem ser os vilões invisíveis
É extrema falta de educação e empatia você está falando com uma pessoa e essa, saca o celular no meio da conversa como se você não existisse no assunto.
A tecnologia está remodelando nosso cérebro de maneiras profundas — e nem todas são benignas. Pesquisas recentes alertam que as mudanças não são apenas funcionais, mas estruturais. Um estudo publicado na Current Biology revelou que a exposição constante a telas alterou significativamente o córtex somatossensorial, região responsável por processar estímulos táteis. Em outras palavras, nossa interação física com o mundo está sendo reconfigurada pela digitalização.
Mas o cerne da questão pode ser ainda mais complexo. Como destacou Manuel Sebastián, pesquisador da Universidade Complutense de Madri, em entrevista ao Xataka, hipertextos com links dispersam a atenção e prejudicam a memória. "A informação fragmentada exige saltos cognitivos que sobrecarregam nosso foco, essencial para a retenção", explicou. O dado é preocupante: em 2023, o tempo médio de atenção humana caiu para 8 segundos, abaixo dos 12 segundos registrados em 2000, segundo o Digital Information World.
A desorganização cerebral não é novidade — nosso cérebro se adapta há milênios. O problema, porém, está na velocidade e na natureza dessas mudanças. Dados do relatório PISA 2022 mostram um declínio global no desempenho em matemática e leitura, com quedas acentuadas a partir de 2015, coincidindo com a popularização de redes sociais e algoritmos de feed infinito. Para John Burn-Murdoch, do Financial Times, a raiz do problema está na transição de um consumo ativo de informação para um fluxo passivo e incessante: "Saímos de páginas estáticas para feeds que nos bombardeiam com conteúdo, notificações e estímulos fragmentados. Isso mina nossa capacidade de concentração e aprendizado profundo".
O algoritmo como acelerador da crise
Especialistas apontam que o risco não está nos dispositivos em si, mas na lógica por trás das plataformas. Um relatório da Nature (2023) sugere que algoritmos que privilegiam engajamento estimulam a multitarefa compulsiva, reduzindo a capacidade de manter o foco em atividades lineares, como leitura ou resolução de problemas. Adolescentes expostos a redes sociais por mais de 3 horas diárias têm 2,5 vezes mais risco de desenvolver transtornos de atenção, segundo a Journal of the American Medical Association (2022).
Apesar dos alertas, ainda há lacunas críticas. "Estamos navegando às cegas", afirma a neurocientista Anna Lembke, da Universidade Stanford. "Algoritmos evoluem mais rápido do que nossa capacidade de estudar seus impactos". Enquanto isso, a plasticidade cerebral — nossa grande aliada histórica — tenta se adaptar. Estudos preliminares indicam que a geração Z desenvolve habilidades visuais e multitarefas mais aguçadas, embora às custas de funções como memória de longo prazo.
O caminho à frente exige equilíbrio. Redesenhar a relação com a tecnologia, priorizando o controle humano sobre as máquinas, parece urgente. Enquanto a ciência busca respostas, uma coisa é clara: entender como os algoritmos moldam nossas mentes não é apenas uma questão intelectual — é um imperativo para preservar nossa saúde cognitiva.