Publicado em: 10/05/2025
Informações: FolhaPress
Em um encontro com a imprensa direto de Roma, na tarde desta sexta-feira (9), seis dos sete cardeais brasileiros que participaram do histórico conclave que elegeu o americano Robert Prevost como o novo Papa Leão 14 compartilharam suas impressões sobre o processo eleitoral e vislumbraram os rumos da Igreja sob a liderança do novo pontífice. O clima era de otimismo e esperança, especialmente após um almoço fraterno com o recém-eleito Papa.
Mulheres e Bênção a Homossexuais no Radar do Diálogo: O arcebispo de Manaus, Dom Leonardo Steiner, trouxe à tona questões sensíveis que foram abordadas com Leão 14: a ampliação da participação feminina na Igreja e a possibilidade de bênção a casais homoafetivos. Dom Leonardo demonstrou confiança na abertura do novo Papa ao diálogo. "Tenho certeza de que o Papa Leão não vai tolher o diálogo. Pelo contrário", afirmou.
Cautela na Ampliação do Papel Feminino: O presidente da CNBB, Dom Jaime Spengler, reconheceu a atuação fundamental das mulheres nas comunidades católicas, citando catequistas e ministras. No entanto, adotou uma postura mais reservada sobre como seu papel poderia ser ampliado institucionalmente, sinalizando a complexidade do tema. "O que seria de nossas comunidades sem as mulheres? Sem as tantas catequistas, ministras da eucaristia, ministra das exéquias? As mulheres em nossas comunidades desenvolvem um ministério extraordinário", elogiou.
Bênção a Homossexuais: Tempo e Discernimento: Ao ser questionado sobre o apoio da Igreja de Leão 14 à bênção de homossexuais, Dom Jaime Spengler manteve um tom pouco conclusivo. "A Igreja sempre deu a bênção a quem se aproxima pedindo a bênção. A bênção não é sinônimo de sacramento. O último documento do Dicastério para a Doutrina da Fé trouxe indicações preciosas nesse sentido e que merecem talvez aprofundamento", declarou, indicando que a questão ainda demandará tempo e reflexão. Segundo o cardeal, grupos de trabalho já estão dedicados a essas questões delicadas, e o discernimento será crucial. "Creio que precisamos de tempo. E aquilo que a Igreja sempre orientou: discernimento. E o discernimento exige saber do que estamos falando, da capacidade de realizarmos juntos e a disposição para o diálogo fraterno. É um caminho em que, sim, precisamos avançar, mas também de tempo."
"Esqueçam o Filme": Bastidores do Conclave sem Hollywood: Sobre os bastidores da votação secreta, Dom Odilo Scherer, arcebispo de São Paulo, desmistificou a imagem glamourosa e tensa retratada no cinema, referindo-se ao filme "Conclave". "A fantasia da opinião pública é muito fértil, ainda mais depois do filme. Mas esquece aquilo do filme", brincou. Dom Odilo explicou que os cardeais retornavam à Casa Santa Marta nos intervalos entre as votações para refeições e conversas informais, um processo que contribui para a formação da opinião de cada eleitor. Ele enfatizou, porém, que essas conversas não se transformam em "comícios" ou apresentações de candidatos, e que o momento da votação diante do crucifixo e do Juízo Final na Capela Sistina impõe uma "responsabilidade muito grande".
Continuidade com Francisco e Sinais da América Latina: O arcebispo de Salvador, Dom Sérgio da Rocha, percebeu uma forte sintonia entre o novo Papa Leão 14 e seu antecessor, Francisco, especialmente em relação à América Latina. "Apesar da importância da origem americana, sem dúvida o Papa tem esse coração muito em sintonia com a Igreja na América Latina, e isso vai contribuir para a sua missão no mundo de hoje. Nesse aspecto há uma grande continuidade. O Cardeal Prevost já tinha Francisco no nome, Francis, mas também no coração. E a Igreja certamente tem ambos no coração", afirmou, lembrando o nome de batismo do novo pontífice: Robert Francis Prevost. Dom Sérgio também destacou a eleição de mais um Papa com forte ligação com a América Latina como um sinal do fortalecimento da região dentro da Igreja. "O fato de termos os dois últimos Papas, podemos dizer, da América Latina mostra que graças a Deus a Igreja da América Latina tem feito uma caminhada pastoral de relevância internacional. É interessante a reação de alguns cardeais depois da eleição, de dizer ‘pois é, a América Latina está oferecendo mais um Papa.’ Pois é, ontem eu ouvi isso."
Esperança de Paz em um Mundo Dividido: O arcebispo emérito de Aparecida, Dom Raymundo Damasceno, expressou a esperança de que Leão 14 seja um defensor incansável da paz. "Pelos depoimentos que tenho a gente percebe é um Papa mais idôneo, mais adequado para os momentos atuais da Igreja e do nosso mundo. Um Papa que começou lá na base, em nosso mundo tão dividido, marcado por tantas guerras, com essa palavra tão ansiada por todos nós: a paz. Certamente ele será um dos grandes produtores da paz no mundo de hoje", afirmou, vislumbrando uma "paz não armada, mas uma paz que se obtém pelo diálogo, na verdade, na justiça no amor, para encontrarmos uma convivência harmoniosa entre todos os povos."
Nome "Leão 14" e a Doutrina Social da Igreja: Dom Leonardo Steiner associou a escolha do nome "Leão" à ênfase na doutrina social da Igreja, lembrando a importância do Papa Leão XIII nesse aspecto. "A gente não pode se esquecer que são Francisco tinha um grande companheiro, que era Leão. Não sei se os dois se encontraram (risos). Mas a Igreja não pode deixar de lado essa questão. Essas questões sociais sempre terão que estar presentes. E o Papa tem uma grande sensibilidade para isso." Ele ressaltou a experiência pastoral de Dom Prevost em uma diocese pobre e sua sensibilidade às questões das periferias, dos povos originários e do meio ambiente. Dom Odilo complementou, explicando que a escolha do nome remete à simbologia dos Papas Leão na história da teologia e da cristologia, e à importância de "voltar a uma boa cristologia", tema abordado no início do conclave.
A coletiva dos cardeais brasileiros pintou um quadro de expectativa positiva para o pontificado de Leão 14, com a promessa de diálogos abertos sobre temas relevantes para a Igreja e para o mundo, e uma continuidade no espírito de proximidade e atenção aos mais necessitados, características marcantes do pontificado de seu antecessor. A Igreja no Brasil e em todo o mundo aguarda com interesse os próximos passos deste novo capítulo da história católica.