Publicado em: 31/03/2025
Brasil diante de uma encruzilhada histórica: terras raras podem gerar riqueza ou aprofundar crises
Enquanto o mundo corre para garantir suprimentos de terras raras — minerais vitais para energias renováveis e alta tecnologia —, o Brasil emerge como peça-chave nesse tabuleiro geopolítico. Com a segunda maior reserva global (21 milhões de toneladas, segundo o Serviço Geológico dos EUA/2024), o país tem potencial para atrair US$ 50 bilhões em investimentos até 2030. No entanto, explorar esse tesouro exige superar desafios ambientais, tecnológicos e regulatórios que podem definir seu futuro econômico.
Mineração de terras raras: a riqueza sob os pés dos brasileiros
Regiões como Araxá (MG) e Poços de Caldas (MG) abrigam jazidas capazes de suprir 25% da demanda global de neodímio e praseodímio — minerais críticos para ímãs de turbinas eólicas e veículos elétricos. A CBMM, líder nacional, investiu R$ 800 milhões em 2023 para ampliar sua capacidade, mas ainda responde por apenas 2% da produção mundial, contra 70% da China.
Por que as terras raras valem mais que ouro no século XXI?
Cada smartphone contém até 60 gramas desses minerais, enquanto um carro elétrico demanda 2 kg. Com o mercado global projetado para saltar de US9,3bilho~es(2023)paraUS 25 bilhões até 2030 (Allied Market Research), o Brasil poderia elevar seu PIB em 1,5% ao ano com uma exploração estratégica. O desafio? Extrair sem repetir os erros do nióbio, onde exportamos matéria-prima bruta e importamos produtos acabados a preços 300% maiores.
Impacto econômico vs. riscos ambientais: o cálculo delicado
Projetos em andamento no Pará e Amazonas prometem gerar 150 mil empregos até 2027, mas esbarram em um grave dilema: a mineração de terras raras produz até 2 mil toneladas de rejeitos radioativos por dia (dados da ONU/2023). Enquanto a China contamina 10% de suas terras cultiváveis com esse passivo, o Brasil tenta criar um modelo sustentável. A Universidade de São Paulo desenvolveu um método que reduz em 80% o uso de ácidos na extração — tecnologia ainda subutilizada por falta de incentivos governamentais.
Sustentabilidade ou colonialismo verde? A corrida pelos minerais da transição energética
A União Europeia ofereceu €2 bilhões em créditos para mineração "verde" no Brasil, mas especialistas alertam: 78% das empresas que exploram terras raras no país são estrangeiras (IPEA/2024). Para evitar nova dependência, o Marco Legal da Mineração (Lei 14.066/24) exige que 30% do processamento ocorra em solo nacional. Resultado? A canadense Appia Rare Earths anunciou uma planta de US$ 400 milhões na Bahia, com transferência de tecnologia para separação de elementos pesados.
O futuro em jogo: entre a soberania tecnológica e a maldição dos recursos
Enquanto o governo lança o Programa Terras Raras 2030 (R$ 5 bilhões em subsídios), a realidade é urgente: hoje, importamos 92% dos ímãs de neodímio, essenciais para a indústria nacional. Se o Brasil dominar toda a cadeia, pode reduzir em 40% o custo de painéis solares e baterias até 2030. Porém, como adverte a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva: "Não seremos potência verde repetindo modelos predatórios. Ou inovamos, ou seremos apenas o quintal mineral do mundo".
Uma nação na balança
As terras raras colocam o Brasil diante de seu maior paradoxo do século: explorar recursos que podem financiar a transição energética global, mas cuja extração arrisca comprometer biomas sensíveis. Enquanto países do G7 pressionam por acordos bilaterais, a resposta brasileira definirá se seremos fornecedores de commodities ou arquitetos de uma nova geopolítica ambiental. O relógio corre — e cada tonelada exportada sem valor agregado é uma oportunidade perdida de escrever um futuro diferente.